Por volta de 2017, iniciou-se no Brasil a discussão sobre tokenização imobiliária. Porém, a grande dúvida à época era a seguinte: como assegurar que  transferências de tokens em redes distribuídas, baseadas em blockchain, pudessem representar efetivamente a transmissão de direitos oponíveis erga  omnes? 

Neste cenário, a DataCurrency desenvolveu, em 2019, uma metodologia  inédita para estruturar juridicamente projetos de tokenização imobiliária, que  recentemente foi publicada no livro: os sete passos da tokenização  imobiliária. Essa metodologia alia a tecnologia blockchain à segurança jurídica  do direito registral brasileiro. 

Três princípios fundamentais 

Antes de conhecer os sete passos, é preciso entender os três pilares da  metodologia: 

1. A tokenização é apenas uma ferramenta. Ela não muda a natureza do  direito, apenas facilita sua negociação. Logo, precisa respeitar o ordenamento  jurídico vigente. 

2. O objetivo da tokenização é a descentralização. Isso significa substituir  intermediários tradicionais, como bancos, por smart contracts autônomos na  rede Ethereum. Quanto menos camadas intermediárias, menores os custos de  transação. 

3. É essencial distinguir o objeto do direito da relação jurídica. O token  representa o objeto (como um imóvel), mas os direitos (como o uso, gozo ou  fruição do bem) só nascem com um contrato válido, que defina essa relação de  forma clara. 

Definidos os princípios, consubstanciou-se o processo em sete passos  fundamentais, que ficaram conhecidos como Os Sete Passos Para a  Tokenização Imobiliária. 

Abaixo descreveremos os sete passos, que poderão ser analisados, com  mais detalhes, em nosso livro “ Os Sete Passos para a Tokenização Imobiliária.

OS SETE PASSOS 

1. Escolha do objeto da relação jurídica 

O primeiro passo é definir o que está sendo tokenizado. No caso da  tokenização imobiliária, o objeto será um imóvel. Mas é fundamental lembrar:  propriedade não é o imóvel, e sim o direito sobre ele. A propriedade é uma  relação jurídica que confere ao titular poderes como usar, gozar e dispor da  coisa. 

2. Criação de um token infungível (NFT) 

Por ser um bem único, o imóvel deve ser representado por um token  também único: um NFT. Esse token será criado por meio de um smart contract e conterá nome, símbolo, ID, e quantidade de decimais, mas ainda não  representará juridicamente nada, até que haja o próximo passo.

3. Cláusula de representação jurídica 

A criação do token não basta para gerar efeitos jurídicos. É necessário  um ato jurídico expresso, como uma cláusula contratual, que vincule aquele  token específico ao imóvel. Exemplo: o token “CasaVerde-001”, criado no  endereço 0x123... da Ethereum, representa o imóvel descrito na matrícula nº  4567 do Cartório X. 

4. Criação de um marketplace smartcontract 

Tokens são objetos programáveis, mas precisam de uma estrutura que  governe sua negociação. Por isso, é necessário desenvolver ou adotar um  marketplace smartcontract ( como o da DataCurrency ) capaz de administrar  regras de emissão de frações do token, recebimento de pagamento e  transferência automatizada dos direitos. 

5. Contrato disciplinando a negociação e exercício dos direitos Um contrato de compromisso de compra e venda, ou contrato de  tokenização, deve detalhar: 

• Quem pode exercer os direitos decorrentes do token; 

• Como será feito o pagamento; 

• Quem paga tributos; 

• Como funcionará o condomínio; 

• O que ocorre em caso de perda da chave privada (no caso da  DataCurrency, usa-se um secret baseado em zero-knowledge proof sem dados  pessoais);

• E, o mais importante: como o marketplace smartcontract funcionará como  protocolo para operacionalizar a compra e transferência desses direitos. 6. Averbação no Cartório de Registro de Imóveis 

O contrato físico precisa ser levado a registro ou averbação. Com base no artigo 1.417 do Código Civil, é possível conferir ao adquirente  um direito real à aquisição do imóvel, desde que o compromisso de compra e venda seja registrado. 

Isso impede, por exemplo, que o mesmo imóvel seja vendido para várias  pessoas diferentes. A segurança jurídica está, aqui, plenamente garantida. Contudo, é possível ainda explorar outras possibilidades, com base na  autonomia privada, de modo a trazer eficácia erga omnes à operação. 7. Inclusão dos documentos jurídicos no metadado do NFT Finalmente, todos os contratos e documentos devem ser anexados ao  NFT como metadados. Isso assegura transparência, rastreabilidade e  auditabilidade pública para qualquer interessado. 

Aplicação prática: a tokenização do compromisso de compra e venda Imagine o seguinte: um imóvel está sendo vendido por R$ 300 mil. Em  vez de um único comprador, ele será fracionado em 300 tokens de R$ 1.000  cada. Cada token confere ao seu comprador um direito real à aquisição do  imóvel, nos termos de um contrato registrado. 

A negociação é feita via marketplace smartcontract, sem banco, sem  cartório (para cada transação), sem intermediários , com execução automática  e transparência pública, graças à tecnologia blockchain. 

Toda a estrutura jurídica é incluída no metadado do token, e o comprador  pode comprovar seu direito com uma transação criptograficamente assinada. 

Conclusão: a verdadeira tokenização começa aqui 

Tokenização não é só criar um token. É criar uma estrutura jurídica e tecnológica que permita a negociação eficiente  de direitos reais, com respaldo legal e redução de custos. 

A metodologia dos sete passos para a tokenização imobiliária, criada  pela DataCurrency, demonstra que é possível fazer isso no Brasil, desde 2019,  embora ainda não exista nenhum projeto com tamanha solidez. 

Se você quer estruturar um projeto sério de tokenização imobiliária,  comece pelos sete passos. E lembre-se: criar tokens não é tokenizar. Tokenizar  é criar uma ponte segura entre o direito real e o ativo digital. 

O escritório Lopes e Zorzo é especialista nessa e em outras metodologias  técnicas e jurídicas de tokenização, sempre com foco na integração com as  finanças descentralizadas, inteligência artificial e IOT.  Por Fernando Lopes e Marcella Zorzo. Advogados especialistas em  tokenização, fundadores do primeiro escritório de advocacia do Brasil  especializado em tokenização e DEFI.  Coautores dos livros “ O Guia Jurídico da Tokenização” e “ Os sete passos para  a tokenização imobiliária.



Marcella Zorzo e Fernando Lopes são advogados especializados em tokenização de ativos reais e finanças descentralizadas, assessorando empresas e empreendedores na estruturação jurídica de projetos baseados em blockchain e smart contracts. Com ampla experiência no setor, auxiliam na conformidade regulatória e no desenvolvimento de modelos de negócios inovadores e juridicamente seguros. Atuam na tokenização de bens, direitos e serviços, garantindo que os projetos estejam em conformidade com a legislação vigente, além de oferecer suporte na criação de estruturas de governança descentralizada e na adequação às normas nacionais e internacionais. Marcella e Fernando também possuem expertise em direito penal econômico, especialmente em questões relacionadas ao mercado de criptoativos, como compliance, prevenção à lavagem de dinheiro, investigações e litígios. Seu trabalho abrange desde a consultoria preventiva até a defesa em processos administrativos e judiciais, assegurando que seus clientes atuem de forma segura e alinhada às melhores práticas do setor.